Nesta vida não tenho muitas conquistas materiais, porém as histórias são diversas. Quem eu seria sem minhas histórias? Não seria eu.

domingo, 9 de março de 2008

Dois caras legais

Amsterdam, 27 de setembro de 2007

Em setembro eu completei 28 anos... foi um aniversário bem diferente daqueles tantos que passei em “casa”. Não teve aquela deliciosa reunião informal e espotânea de minha família, não teve bolo da minha mãe, não teve parabéns pra você. Fui comer com a Susanne num restaurante bem bacana e depois demos uma volta pela cidade. Foi diferente dos outros... mas muito gostoso e especial. Foi a primeira vez desde que nos conhecemos, que estivemos juntos no meu aniversário.
Setembro, além de me dar mais um ano, me deu a visita de um amigo. O Wally passou duas noites por aqui. Foi uma correria, visita rápida é assim... mas foi uma delícia. Está difícil escrever sobre setembro, mês que no Brasil é comemorado pelo fim do inverno, enquanto deste lado lamenta-se a aproximação dele... sempre coloco aqui coisas que me marcaram, muitas vezes falo de lugares, viagens, encontros... desta vez vou descrever duas pessoas...

O Santiago é um cara bacana. A primeira vez que eu o vi, eu estava chegando pra trabalhar... o cara estava furioso, ele davas chutes numa parede. Logo percebi que ele não falava holandês, a raiva provavelmente vinha por ele não conseguir se comunicar com ninguém. Só quem passa por isso sabe o tamanho da frustação de não compreender e de não ser compreendido.
A raiva dele era tanta que fiquei até receoso de me aproximar... um tempo depois eu cruzei com ele de novo. Eu ia entrar no prédio onde trabalho e atrás de mim vinha ele. Abri a porta e disse: “Tu primero!”.
Poxa, ele olhou pra mim e um sorriso apareceu naquela cara ainda meu frustada. Desenrolei meu velho portunhol e conversamos um pouco. Ele é latinoamericano como eu.
Outro dia nos encontramos de novo, ele já parecia mais feliz, percebi que já arranhava bastante bem o holandês. Como ele aprendeu rápido!
Eu me vi nele, me lembrei das primeiras vezes que compreendia as conversas, que conseguia ser mais claro nas coisas que dizia.
Quando nos vemos ele fica sempre um pouco mais alegre, e eu também. É bom ver alguém que passou pela mesma mudança que eu se adaptando a nova casa.
Na primeira vez que conversamos eu cheguei a perguntar se ele sentia falta de casa... a resposta foi de tamaha inteligência: “Agora... aqui é minha casa”. O Santiago tem 6 anos.

O Bas também é um cara bacana... Conheci ele ano passado quando passei a treinar numa clube de futebol aqui em Amsterdam. Alto, loiro, gosta de uma cerveja, viajou pelo mundo, deu um tempo na vida daqui e cuidou de um bar por alguns anos numa ilha do Caribe. Praticante de esportes de inverno e de verão é um típico holandês.
Num final de semana fomos pra um bar depois de um jogo. Na quarta o treino foi mais diferente do que qualquer outro. O Bas um dia antes estava fazendo Kitesurf. Uma corrente de vento inesperada durante um salto fez ele voar ainda mais. Ele se chocou contra um pier.
Enquanto nossa equipe treinava, um integrante dela estava numa cama de hospital em sua segunda noite de sua nova vida. Um vida sem movimentos do peito pra baixo.

As vezes a gente tem medo das mudanças... as vezes não temos paciência pra enfrentar as consequências de nossas decisões e por isso acabamos não aproveitando as coisas positivas que encontramos... as vezes, ou quase sempre, reclamamos de boca cheia.
O Santiago não queria vir pra cá, ele diz que a mãe dele também não gosta daqui, mas ele em seus 6 anos sabe que aqui é sua casa e que mesmo as vezes tendo crises de raiva ele tem feito de tudo pra se adaptar.
O Bas queria continuar a jogar futebol e a fazer kitesurf. Ele não escolheu sua vida nova... mas quando o médico responsável pela sua revalidação perguntou onde ele queria chegar ele disse: ”Onde eu quero chegar eu não sei... eu quero é poder conquistar um pouquinho a cada dia”.

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