Nesta vida não tenho muitas conquistas materiais, porém as histórias são diversas. Quem eu seria sem minhas histórias? Não seria eu.

sexta-feira, 29 de janeiro de 2010

Um utópico desejo


Já faz algum tempo que eu tento não generalisar tudo o que vejo... tentar entender as coisas e aceitar que existem diferenças é pra mim sempre a melhor solução pra viver bem onde eu estiver.
Mas algumas vezes acontecem daquelas, que de tão marcantes e exageradas, fica impossível de não dizer: "só aqui pra acontecer algo assim!!!!"


Eu pedalava de volta para casa, vinha de longe. Meu caminho me fazia passar próximo a um amigo. Os dedos meio gelados da luva molhada pela chuva me obrigaram a parar. Toquei a campanhia... nada. Olho pra cima e da rua eu vejo as luzes da TV. Toquei mais uma vez... nada. Fui olhar de novo, pra ver se não tinha olhado pra janela errada. A TV dele estava realmente ligada... Com os dedos gelados segui meu caminho.


A última vez que nos vimos foi há mais de 10 anos... e são quase 10 anos sem notícias. Por estar de volta, resolvi ligar, seria bacana saber das coisas:

- Como é que vai rapaz? Quanto tempo!!
- Pois é, faz tempo mesmo. Comigo vai tudo bem e com você?
- Tudo bem. Aproveitando das férias... estou curioso pra saber como andam as coisas. Faz muito tempo que não tenho notícias.
- Tudo na mesma. Trabalhando... indo pra praia... aproveitando da vida.
- E a filha... deve estar grande?
- Pois é. Tá sim...
- E com o que você tem trabalhado?
- Ah... não vamos falar disso não...
- Como assim?
- Assim... sei lá... não quero falar disso não... eéée...
- Por acaso você sabe realmente quem está falando?


Da próxima vez que encontrei meu amigo comentei que tinha passado na casa dele outro dia...
- Era você?! Caramba estava assitindo TV, mas como não estava esperando ninguém acabei não atendendo. Você deveria ter ligado...
- Pois é, estava só passando e resolvi parar.


- Poxa... mas fazia tempo tempo que a gente não se falava. Como eu poderia imaginar que você me ligaria assim.
- Não se preocupe, eu entendo perfeitamente.


As vezes, quando estou por aqui, eu sinto um pouco de falta da espontaneidade... de receber alguém de supresa, de uma balada surgir do nada, destas coisas que simplesmente acontecem. Por que é que quase tudo tem que ser combinado? Por que as pessoas marcam uma balada pra daqui a 3 semanas? Por que as coisas não podem somente "acontecer"? Eu me recuso a anotar um encontro com um amigo em minha agenda...

Quando estou no Brasil, sinto falta de poder acreditar em tudo o que as pessoas dizem. Eu compreendo alguém não se lembrar de mim depois de tantos anos, mas por que fingir conhecer alguém e continuar uma conversa? Por que dizer "que saudade" se as pessoas não fazem o menor esforço pra se ver? Por que dizer "tá cedo, fica mais um pouco" se o desejo é que a visita logo se vá? Hoje eu prefiro não acreditar em tudas as coisas que ouço...

Eu gosto muito de viver por aqui... como sempre gostei muito de viver e estar no Brasil. Mas isso não me tira o direito de as vezes lamentar que a Holanda não tenho um pouquinho de Brasil e que o Brasil não tenho um pouquinho de Holanda.

Nos meus sonhos, meus dois mundos seriam um só...

sábado, 16 de janeiro de 2010

Dois mundos



Aquelo longo dia de trabalho felizmente chegava ao fim. Casaco fechado, mochila nas costas e luvas em baixo do braço... hora de ir pra casa. Uma breve passagem pelo mictório faria o retorno mais agradável. Ainda com o braço esticado, segurando o botão de descarga, assisto meu par de luvas descer por água abaixo.

Por muito tempo, foi meu sonho ter ali uma casa, a beira daquela areia inclinada, no começo fina e branca, mais logo depois grossa e avermelhada. Os finais de tarde em Massaguaçú são das melhores lembraças que guardo de minha infância. Ponta de Capricórnio de um lado, praia da Cocanha de outro... ilha de Massaguaçú, do Tamanduá e Ilhabela mais ao fundo. Por que foram construir aqueles dois prédios feios que agora me atrapalham ver a serra?!
Descíamos correndo em direção a água ao encontro de uma grande marola. Essa era nossa diversão. Nos dias que as marolas viravam ondas, ralávamos nosso peito pegando jacaré.
Eu já não era mais criança, já não sonhava mais em ter casa ali, estava difícil de partir, mas outro lugar encontador me esperava... hoje eu já vi muitas outras praias, mas Massaguaçú, ao entardecer, continua sendo a minha preferida.

O cadeado estava até meio emperrado por congelamento, a bicicleta fria como neve... meus 25minutos pra casa pedalando eram tortura de mãos desnudas. Num mercado próximo, único comércio aberto depois das seis, nada de luvas em suas prateleiras. Mas uma bela promoção me fez sorrir: 3 pares de meia por 2 pilas.

Com os pés de fora e sem camisa, eu tomava um sorvete na varanda de casa. Já era quase meia noite. O verão apenas começara, meu eu desfrutava daquela noite como se ela fosse a última. Meus pais me faziam companhia. As vezes eu acho que não há nada melhor que uma noite de verão...

Sobre uma Amsterdam branquinha de neve eu pedalava de volta pra casa. Incrível que há apenas alguns dias eu tomava aquele sorvete com meus pais, naquela minha última noite de verão. Incrível como agora, feito piloto de rali, em trilhas pelo gelo eu me equilibrava. Numa hora, desfrutava de uma noite quente, me refrescando com um sorteve, outra hora, desfruto de uma Amsterdam enfeitada pela neve, aquecido com três pares de meias feito luvas.
Incrível como em tão pouco tempo possa estar em duas realidades tão diferentes... mais incrível é como já ficou normal, estar um dia lá e o outro aqui.
Hoje eu vivo em dois mundos.

sábado, 5 de dezembro de 2009

hoje eu sou meu Pai


estávamos na casa dos meus avós, em lorena. flamengo x botafogo na tv. estádio lotado, tão cheio que a torcida vazou pelo ladrão.

na entrada da área uma falta pro flamengo. o junior, na verdade leovegildo, se prepara pra bater. Ele disse: "dali ele não perde!"

dito e feito! instantes depois, o junior, com seus 38 anos anos, pula e corre como um garoto.
eu, com um pouco de inveja, O vejo festejando o seu idolo. foi o ultimo campeonato brasileiro pro mengão, num longínquo 1992.


no ano seguinte Ele nos levou pela primeira vez ao morumbi... meu tricolor era o atual campeão do mundo. amistoso para entrega de faixas. do outro lado o sevilla, com maradona e tudo.
foi uma grande festa! uma alegria pra três pequenos sãopaulinos - eu, daniel e alexandre. pra ajudar a secar o corpo da chuva intensa de verão, pulávamos o tempo todo. e Ele pulava com a gente.

Ele sempre tentou disfarçar. mas lá dentro há um fanático torcedor, talvez um pouco da criança que Ele um dia foi. em momentos decisivos, o torcedor é quem manda. me lembro bem de um flaflu, em que Ele, trancado em seu quarto, solitário ouviu o jogo em companhia de seu radinho.

1993, segunda final de libertadores pro meu são paulo. morumbi gelado de inverno. lá estávamos nós: Ele, eu e daniel. aquele time com raí, palhinha, muller, cafu, zetti e companhia fez o placar mais dilatado de uma final de libertadores: 5x1! inesquecível... juntos vibrávamos a cada gol. Ele acabou virando mais um naquela multidão tricolor.

semana passada enquanto "skypeava" com minha mãe, ouvia Ele lá em baixo, vibrando com seu flamengo... me vieram na cabeça as lembranças daquele dia, que por causa de uma inveja boba, nem feliz por Ele eu consegui ficar. me lembrei também da sua cara de tristeza, com o flaflu perdido com um gol de barriga daquele gaúcho.

por muito tempo eu fiquei sem entender direito como poderia um flamenguista como Ele, vibrar assim com o meu próprio time.

hoje pra mim é claro que naquelas vezes no morumbi, Ele não era flamento ou são paulo... Ele era "eu e meu irmão". era por nós que Ele vibrava!

hoje, nas finais do brasileiro, independente do que vier, eu sou meu Pai... o meu Pai é rubro-negro...

hoje nas finais do brasileiro eu sou flamengo!

sábado, 21 de novembro de 2009

Respeito


A região onde trabalho é bastante característica aqui em Amsterdam. Por ser nova, seu planejamento e construções se diferenciam bastante de grande parte da cidade. Prédios comerciais altos de arquetura modernosa, ruas e calçadas largas e shoppingcenter fazem por lá parte da paisagem.
Por suas características, esta região da cidade atraiu uma população específica, entre os quais: idosos e imigrantes classe business.
Os idosos aproveitam da acessibilidade criada pelas ruas e calçadas largas e os imigrantes escolhem as casas, ou apartamentos grandes, próximos aos locais de trabalho.

Um dia, na minha concepção, uma das grandes diferenças entre Brasil e Holanda, ou mesmo outro país "rico e desenvolvido" foi o respeito à população, seja pelos governantes ou mesmo de forma geral... hoje já não sei mais...

Por causa do trabalho, acabei conhecendo uma família inglesa na qual o filho participa de várias de nossas atividades esportivas. A mãe é cadeirante.
Por estas dias encontrei esta mãe, enquanto eu visitava uma de nossas clínicas de tênis de mesa. Ela estava frustrada por ter que ficar na chuva, do lado de fora, esperando alguém passar para que a ajudasse a entrar no ginásio da escola, já que os dois degraus que levam à porta são barreiras intransponíveis pra ela e sua cadeira de rodas.

Até a pouco tempo, muitos velhinhos das redondezas matavam as horas sentados nos bancos do shopping do bairro... dalí acompanhavam o movimento e mantinham algum contato social.
Os novos proprientários do shopping resolveram fazer uma faxina geral, mudaram a fachada, trocaram o piso, deram nova cor às paredes. Os bancos dos velhinhos foram trocados... vieram outros novos, sem encosto.

A mãe inglesa, já cansou de pedir a escola rampas de acesso por ali. Como resposta ela sempre ouve: "somos obrigados a instalar as rampas caso algum aluno delas necessite."
Como ela diz: "isso é a Holanda!"

Lá, sem encosto, os velhinhos já não se sentam mais...

Os respeito sempre existe... mas desde que ele não interfira no próprio bolso, afinal construir rampas de acesso pelo escola, pois causa de uma mãe, deve custar muito dinheiro e velhinhos tomando conta de um shopping, sem lá muito consumir, é com certeza prejudicial aos negócios.

segunda-feira, 19 de outubro de 2009

"Book"

De beduíno a modelo nú, passando-se ainda por figurante de cena de filme, fugitivo desesperado, bisbilhoteiro tarado fã da Rita Cadillac, entre outras tantas... como já falei outras vezes, de vez em quando brinco de ser modelo, e se a curiosidade for grande, é só conferir o vídeo.



quarta-feira, 14 de outubro de 2009

Poucos segundos

Como quase nunca, a magrela não era minha companheira naquela manha de segunda feira.
As manhas de segunda já são meio melancólicas, sem ela e sentado num ônibus então, nem se fale.

Eu não a vi da cintura pra baixo, mas dali pra cima ela era daquelas mulheres de parar o trânsito. Mesmo pra alguém como eu, decidido e fiel, seria a coisa mais natural do mundo gastar uns segundos de um semáforo no vermelho olhando pra ela. Numa hora como aquela então, isso seriam completamente compreensível mesmo pra mais ciumenta das mulheres.

Loira como muitas por aqui... cabelo longo e ondulado, meio preso meio solto. Como uma moleca, chupava a ponta do indicador. Parecia que pra ela, o mundo fora daquele carro não existia. Era como se fosse ela e nada mais.

Os poucos segundos se tornaram longos, me vi meio hipnotizado, numa mistura de espanto e graça. Fazia muito tempo que uma outra mulher bonita, que não fosse a minha, prendesse tanto a minha atenção.

Eis que ela olha em minha direção. Meio sem saber o que fazer, disfarço o olhar. Confesso que, sem saber porque, afinal nunca fui de fugir de um olhar feminino, fiquei envergonhado.

Mas curiosidade venceu a vergonha e voltei a olhar pra ela.

Um indicador de uma leve mão voltava a tocar aqueles lábios... movimento sutil antecedido por um lampejo de furiosidade, em mais uma profuuuunnnnda cutucada no nariz.

Luz verde... final daqueles poucos segundos que fizeram minha manha.

PS: antes de comer as melecas ela ainda dava um longa olhada na mercadoria...