Nesta vida não tenho muitas conquistas materiais, porém as histórias são diversas. Quem eu seria sem minhas histórias? Não seria eu.

sábado, 16 de janeiro de 2010

Dois mundos



Aquelo longo dia de trabalho felizmente chegava ao fim. Casaco fechado, mochila nas costas e luvas em baixo do braço... hora de ir pra casa. Uma breve passagem pelo mictório faria o retorno mais agradável. Ainda com o braço esticado, segurando o botão de descarga, assisto meu par de luvas descer por água abaixo.

Por muito tempo, foi meu sonho ter ali uma casa, a beira daquela areia inclinada, no começo fina e branca, mais logo depois grossa e avermelhada. Os finais de tarde em Massaguaçú são das melhores lembraças que guardo de minha infância. Ponta de Capricórnio de um lado, praia da Cocanha de outro... ilha de Massaguaçú, do Tamanduá e Ilhabela mais ao fundo. Por que foram construir aqueles dois prédios feios que agora me atrapalham ver a serra?!
Descíamos correndo em direção a água ao encontro de uma grande marola. Essa era nossa diversão. Nos dias que as marolas viravam ondas, ralávamos nosso peito pegando jacaré.
Eu já não era mais criança, já não sonhava mais em ter casa ali, estava difícil de partir, mas outro lugar encontador me esperava... hoje eu já vi muitas outras praias, mas Massaguaçú, ao entardecer, continua sendo a minha preferida.

O cadeado estava até meio emperrado por congelamento, a bicicleta fria como neve... meus 25minutos pra casa pedalando eram tortura de mãos desnudas. Num mercado próximo, único comércio aberto depois das seis, nada de luvas em suas prateleiras. Mas uma bela promoção me fez sorrir: 3 pares de meia por 2 pilas.

Com os pés de fora e sem camisa, eu tomava um sorvete na varanda de casa. Já era quase meia noite. O verão apenas começara, meu eu desfrutava daquela noite como se ela fosse a última. Meus pais me faziam companhia. As vezes eu acho que não há nada melhor que uma noite de verão...

Sobre uma Amsterdam branquinha de neve eu pedalava de volta pra casa. Incrível que há apenas alguns dias eu tomava aquele sorvete com meus pais, naquela minha última noite de verão. Incrível como agora, feito piloto de rali, em trilhas pelo gelo eu me equilibrava. Numa hora, desfrutava de uma noite quente, me refrescando com um sorteve, outra hora, desfruto de uma Amsterdam enfeitada pela neve, aquecido com três pares de meias feito luvas.
Incrível como em tão pouco tempo possa estar em duas realidades tão diferentes... mais incrível é como já ficou normal, estar um dia lá e o outro aqui.
Hoje eu vivo em dois mundos.

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